O Supremo Tribunal Federal – STF deve julgar na próxima semana uma ação sobre concessão de pensão vitalícia concedida à esposa de um juiz classista aposentado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região. Aos 72 anos, ele se casou com a própria sobrinha, de 25, quatro meses antes de morrer. Para o Tribunal de Contas da União – TCU, a união foi arquitetada unicamente para recebimento do benefício.
Em sua análise do caso, o TCU concluiu pela ilegalidade da pensão vitalícia e determinou a suspensão dos respectivos pagamentos. O plenário assentou ilegal o ator por meio do qual fora concedida a pensão civil à sobrinha, ou seja, o casamento realizado em 1999. A sobrinha asseverou a validade do matrimônio junto ao STF.
Para a mulher, o casamento não deveria ser objeto de apreciação pelo TCU e somente poderia ser declarado nulo com ação judicial específica. O Tribunal, contudo, nega haver se substituído ao Judiciário para invalidar o casamento, que teria sido desconsiderado exclusivamente para fins de pensão estatutária.
Caso é estarrecedor, segundo ministro
Em 2010, o ministro Marco Aurélio, relator, deferiu a liminar pleiteada para restabelecer, até o julgamento final do mandado de segurança, a pensão da impetrante. O caso pode entrar em julgamento no plenário virtual do STF para o próximo dia 18 de dezembro.
Em seu voto já expedido, Marco Aurélio entendeu que não há direito líquido e certo na pensão e indeferiu o mandado de segurança. “O caso é realmente estarrecedor e mostra que não se tem respeito maior pela fidelidade de propósito, respeito maior com a coisa pública”, observou o magistrado.
O decano observou que não houve o desfazimento, pelo Órgão de Contas, do casamento, mas simples consideração “de quadro fático a implicar a insubsistência da pensão em virtude da má-fé que a cercou”. Na visão de Marco Aurélio, o Tribunal de Contas abandonou o formal – a certidão de casamento – para levar em conta a realidade, identificando fortes indícios de fraude.
Casamento de colaterais
Membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, o advogado Anderson de Tomasi Ribeiro explica que não há vedação ao casamento entre tios e sobrinhos. Tal possibilidade é garantida pelo Decreto 3.200/1941, em seu artigo 1º: “O casamento de colaterais, legítimos ou ilegítimos do terceiro grau, é permitido nos termos do presente decreto-lei”.
Sob o ponto de vista legislativo, a principal divergência diz respeito à concessão da pensão por morte. Segundo Anderson, o tema atualmente é regido pela Lei 13.135/2015, que não se aplica ao caso, já que a morte do juiz classista ocorreu em 1999. Há cinco anos, tanto para o regime próprio quanto para o regime geral, o direito ao benefício está condicionado a dois requisitos: 18 contribuições do cônjuge ou companheiro falecido e a comprovação de dois anos de união estável ou do casamento.
“Caso sejam demonstrados esses dois requisitos, a pensão por morte levará em conta a idade do sobrevivente. A pensão passa a ser vitalícia tão somente a partir dos 44 anos, antes disso o período de pagamento do benefício é progressivo”, acrescenta Anderson. Ainda se fosse regido sobre a lei promulgada em 2015, haveria vedação pelo fato de o casamento ter acontecido meses antes da morte do marido, sem o cumprimento dos dois anos necessários.
Simulação ou fraude
O advogado lembra ainda que o regramento de 2015 alterou a Lei 8.213/1991, em seu artigo 74, parágrafo 2º, para impor a perda do direito à pensão por morte caso seja demonstrado que houve simulação ou fraude na composição do casamento ou da união estável.
“Ocorre que o óbito se deu em 1999, e a legislação não trazia essas previsões. A legislação anterior nem sequer dispunha a esse respeito. Partindo do pressuposto que todos os benefícios são regidos sob o princípio da boa-fé, a má-fé tem que ser provada e demonstrada; nesse caso, pelo TCU ou pelo ente que está respondendo como réu”, detalha Anderson.
O especialista assinala: “Como o óbito ocorreu anteriormente à redação de 2015, não há nenhuma vedação quanto a essa situação. Mesmo o fato de eles terem uma grande diferença de idade não é empecilho sob o olhar da previdência social”.
Acesse o site do STF e acompanhe o julgamento do Mandado de Segurança – MS 29.310.