ARTIGOS

Direito do Trabalho


“Atendente múmia”: Juíza condena empresa a pagar R$ 14 mil por obrigar trabalhadora a cobrir tatuagem


Juri News em 19/04/2022


O Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (TRT-10) condenou uma locadora de carros do DF a pagar R$ 14.275 de indenização e outros direitos trabalhistas, por danos morais, a uma mulher que era obrigada a usar batom e cobrir diariamente as tatuagens com fita adesiva, sob o risco de ser demitida. A decisão é da juíza do Trabalho substituta Katarina Roberta Mousinho de Matos Brandão que considerou que o tratamento dispensado pela empresa à trabalhadora foi vexatório e humilhante, atentando contra sua dignidade e ocasionando profundo abalo psicológico.

A trabalhadora conta, nos autos, que além de ser obrigada a usar batom, sofria tratamento diferenciado, de forma negativa, por usar tatuagem, a qual não podia ficar visível aos clientes, devendo ser coberta com uma fita adesiva sob pena de demissão, chegando a ser chamada de “atendente múmia”. O mesmo, segundo ela, acontecia com outras colegas. Com esse argumento, pediu a condenação da empresa ao pagamento de indenização por danos morais.

Em sua decisão, a juíza salienta que, segundo a Convenção Interamericana para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher (Belém/PA 1994), “violência contra a mulher é qualquer conduta baseada no gênero, que causa morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto na esfera pública como na esfera privada. Ainda, em conformidade com o artigo 6º, o direito de toda mulher a ser livre de violência abrange, entre outros, o direito da mulher a ser livre de todas as formas de discriminação”.

Ao lembrar que a proteção da empregada contra discriminação, independente de qual seja sua causa, está prevista na Constituição Federal, a juíza ressalta que o Brasil é signatário da Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres – que obriga os países a proibir toda discriminação contra a mulher e a estabelecer a proteção jurídica dos seus direitos.

Menciona na sentença, também, a Lei nº 9.029/1995, que proíbe a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso à relação de trabalho, ou de sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, etc.

ESTERIÓTIPO MISÓGINO
Mesmo com esse arcabouço normativo, salienta a magistrada, “fatores histórico/culturais enraizados na nossa sociedade patriarcal perpetuam a discriminação contra a mulher, com a adoção do estereótipo misógino como consta na peça contestatória e transcrito nesta sentença”. Tanto é assim que, ainda segundo a juíza, não havia imposição de uso de meia calça ou uso de material para cobrir tatuagem nas pernas para os homens, já que era possível a utilização de calça para trabalhar.

Para a magistrada, cabe ao empregador coibir a prática de assédio moral e garantir que as mulheres sejam respeitadas, evitando práticas misóginas, que afetam a dignidade humana e criam um ambiente humilhante para as trabalhadoras.

Mas, no caso em análise, a empresa dispensou tratamento vexatório e humilhante à trabalhadora, que foi obrigada a, rotineiramente, cobrir a tatuagem com o uso de meia calça e fita adesiva, atentando contra sua dignidade e ocasionando profundo abalo psicológico.

Assim, por considerar que a conduta da empresa constitui ato ilícito a ensejar dano de caráter imaterial ao patrimônio do indivíduo, a juíza condenou a empresa a pagar à trabalhadora indenização por dano moral.